sim, eu sei que a expectativa é ver as fotos do dia, mas tenho uma história pra contar.
Antes de Paris, teve a aliança.
Foram meses pra encontrar quem pudesse fazê-la do jeito que eu imaginava.
Um trabalho artesanal, com uma designer de Porto Alegre. Pedra, formato, e várias coisas que eu nem sabia que existiam pra formar a joia perfeita.
O tipo de escolha que já começa a contar a história antes dela existir.
Quando botei a aliança no bolso e fui viajar com a Raquel,
eu sabia que ia acontecer.
Eu só não sabia onde, nem quando.
Andei meia Europa com esse segredo batendo no peito, literalmente, no bolso de dentro da jaqueta jeans, ensaiando as possibilidades.
Até que, com a cabeça no colo dela, vendo a Torre Eiffel se acender contra o entardecer, eu soube:
É esse o momento!
Era isso.
Era com ela.
Um grito ao mundo, à Raquel e a mim mesmo.
Não era um convite pra um passeio.
Era uma promessa de viver.
E assim a promessa foi feita. Juntos!
Pedras no caminho
Dois meses depois, em dezembro, o corpo falou.
Comecei a passar muito mal do estômago.
E o fim de ano, que sempre foi importante pra nós, se aproximava.
Eu estava fragilizado: físico e emocionalmente.
Raquel ficou comigo, como sempre ficou.
Acompanhou consultas,
cuidou da rotina,
cuidou de mim.
Foi nesse ponto que a chave virou pra mim.
Depois de anos me auto-sabotando, entendi a real promessa.
Ela não era somente pra Raquel.
Ela era pra mim também.
Eu tinha prometido viver.
Com ela.
E viver longo.
Com saúde.
Com presença.
E estavam ali, diversas pedras no caminho da longevidade:
no caminho,
e na vesícula.
Escolhas difíceis
Comecei a pensar no que seria esse casamento.
No que significava me apresentar inteiro nesse ritual.
Em fevereiro, começamos a buscar o lugar.
Sabíamos que queríamos casar debaixo de uma árvore.
Algo simples e simbólico.
Difícil ou caro de encontrar no meio de uma metrópole.
No dia 20 de abril de 2024, achamos.
Logo ao lado de casa, menos de 30 km.
A figueira tinha mais de 220 anos.
O dia estava ensolarado.
Sentamos num banco, na sombra da figueira,
olhando as oliveiras, com o céu aberto.
E ali a gente soube qual era o lugar.
Em seguida, outra dúvida: a comida. Fechamos com o Márcio.
Ele tem todas as qualidades que buscávamos num chef:
simpático,
atencioso,
detalhista,
e cozinha bem... além de ser pai de um amigo em quem confiamos.
E o fotógrafo?
Franco. Até demais.
No nome e no trato.
Além de ótimo fotógrafo, dividimos amores por estilos parecidos.
E seu portfólio impecável não deixou dúvidas.
O plano começou a ganhar corpo.
Plano por água abaixo?
Duas semanas depois, o Rio Grande do Sul afundou na água.
A enchente de maio veio com tudo: levou casas, certezas, e também o nosso chão.
Saímos de barco de casa...
Com isso veio uma novidade. Eu já vinha tentando parar de fumar,
mas foi depois do resgate, do medo, do susto, que decidi parar por inteiro.
Se eu queria viver com a Raquel, precisava parar de me consumir.
Nunca mais toquei num cigarro.
Peregrinamos, fugindo das águas.
Fomos pra Torres, pra Floripa, pra Serra.
Deixando o planejamento do nosso evento em segundo plano enquanto sobrevivíamos.
E com todas essas mudanças, começamos a pensar mais do que no casamento:
onde a gente queria morar,
reconstruir,
viver.
De volta às celebrações
Em agosto convidamos nosso celebrante: Jiba.
Já sabíamos que seria ele. Sempre soubemos.
Mas com toda a correria, foi nesse momento, numa mesa de bar no meio da rua, que fizemos o pedido.
Nosso amigo querido, pessoa boa com o coração e palavras melhores ainda, aceitou.
Foi um pouco depois daquela correria toda que comecei a testar cortes, tinturas, possibilidades.
Sil³, sempre topando minhas loucuras...
Mas essa era diferente.
Essa era especial.
E com isso chegou novembro e fiz meus 30.
Meu amor organizou uma festa com um bolo emo <3
E após a festa, fizemos mais um acordo: álcool, só no Natal!
No Natal, quebramos mais um ciclo.
Fomos acolhidos por um novo local e uma nova família.
Eu, que sempre carreguei expectativas familiares sobre essa época, pude ser só o Bruno.
Só isso.
E isso foi libertador.
Foi nesse mesmo tempo que comecei a prestar atenção em outro peso: o do corpo.
Mudei hábitos de comida.
Troquei o pudim por chia, o sorvete por whey.
Comecei a prestar atenção no porquê de cada escolha.
Perdi 16 quilos, entre o Natal e o casamento.
Ganhei o direito, assim, de dançar até o chão no dia do casamento sem estar destruído no dia seguinte.
O fim de ano veio calmo.
Recebemos a Julya em casa para a virada.
Jantamos, conversamos.
Tudo perfeito para aquele momento.
Ainda tivemos a formatura do meu amor para celebrar em Fevereiro




E começa 2025
Em janeiro, Raquel já tinha vestido. Dois, pra ser mais exato.
Eu, em janeiro, comecei a pensar no meu traje. E aí veio a surpresa.
Todas as lojas diziam não.
O corpo fora do padrão não cabia nos moldes.
Até que achei o Matheus: alfaiate.
Pessoa aberta, cuidadosa, detalhista.
Juntos, costuramos mais do que uma roupa. Costuramos uma forma de me apresentar ao mundo para uma nova fase.
Antes da cerimônia, veio o ensaio fotográfico.
A gente sempre soube onde queria fazer: no Agulha.
Um bar alternativo, no fundo do beco à esquerda, com uma Kombi estacionada, uma mesa de pingue-pongue, e lembranças nossas espalhadas pelos móveis.
Mas a enchente levou o Agulha também.
Perdemos esse espaço.
Fomos então pro Mercado Público de Porto Alegre.
No dia mais quente do ano (ao menos pareceu).
Eu pingando no meu traje de lã.
Mas rindo. Dividindo bolo de milho. Tomando café na nossa livraria preferida.
Subindo a Casa de Cultura, registrando um pouco da gente.
Foi um dia lindo.
Inesquecível.
Nosso.
Obrigado, Franco.
E os padrinhos?
Fizemos tudo à mão. Caixa por caixa.
Forradas com linho vermelho-arroxeado.
Convite impresso.
Azeite do lugar da cerimônia.
Cartas manuscritas.
E desenhos feitos pela minha irmã e minha cunhada.
Foram chegando aos poucos, um a um, no tempo de cada um.
Como tudo que é feito com amor.





A cerimônia viria depois.
E isso fica pra outro(s) texto(s).
Mas antes dela, o que houve foi isso:
um processo. Um corpo em mudança.
Uma vida sendo costurada entre escolhas pequenas e escolhas fundas.
O casamento não foi só uma data.
Foi o gesto longo de começar a viver.
Agora por inteiro, e plenamente.